Um artigo interessante publicado num blog do New York Times examina como ajudar pessoas com autismo na interação social e dá uma resposta que nós já conhecemos para essa pergunta: crianças, adolescentes e adultos com autismo podem aprender a se relacionar e a desenvolver suas habilidades de interação social e comunicação simplesmente brincando!
E o artigo vai mais longe. Ele pergunta: por que não usarmos os personagens favoritos da pessoa com autismo para promover, através das brincadeiras, o seu aprendizado social? O artigo sugere que as atividades lúdicas desenvolvidas junto às pessoas com autismo podem ser aproveitadas de forma mais profunda, eficaz e valorosa para a interação social a partir da utilização dos personagens prediletos da criança, adolescente ou adulto.
Kevin Pelphrey, diretor do laboratório de neurociência da criança na Universidade de Yale, defende a individualização e a personalização da terapia para cada criança e, sendo assim, na opinião dele, se uma criança tem uma afinidade com certos personagens animados, seria absolutamente válido propor uma terapia que incorpore os personagens prediletos dela de forma significativa.
Kevin Pelphrey, juntamente com outros pesquisadores, tais como John D. E. Gabrieli, do MIT, Simon Baron-Cohen, da Universidade de Cambridge, e Pamela Ventola, de Yale, estão propondo um ensaio clínico para testar esta proposta. A ideia teria surgido a partir do livro “Life, Animated” escrito por Ron Suskind, que é um ex-repórter do Wall Street Journal. Nele, Ron fala sobre seu filho, Owen, que tem autismo e que é apaixonado por filmes da Disney como “A Pequena Sereia” e “A Bela e a Fera”.
Ron Suskind conta de maneira emocionante como o pequeno Owen, que regrediu em suas habilidades sociais e em sua comunicação em torno dos 3 anos de idade, usou a repetição de cenas de um filme da Disney para comunicar aos seus pais a sua dificuldade em falar. Owen teria escolhido o trecho “Just your voice” (“Apenas a sua fala”, em Português) da bruxa Úrsula, que no filme “A Pequena Sereia” havia roubado a voz da sereia Ariel, para expressar o que ele próprio estava sentindo. Owen tinha perdido sua habilidade de falar e estava não verbal naquele momento. Assim como a personagem do filme, o pequeno Owen também não tinha “voz”. Esta experiência fora crucial para a família, que, aos poucos, decidiu aproveitar o fato de Owen ficar atento e focado ao assistir seus filmes favoritos para então usar os elementos e personagens desses filmes como um canal de aprendizado social.
Sobre o ensaio clínico que será conduzido pelos pesquisadores, originado a partir da experiência de Ron e de seu filho Owen, Sally J. Rogers, professora de psiquiatria no Instituto MIND, da Universidade da Califórnia, e co-autora da abordagem americana Early Start Denver Model, diz: “A hipótese que se colocou à frente é boa, e absolutamente vale a pena estudá-la”. “Se você pensar sobre esses personagens animados, eles são fortes estímulos visuais: as emoções dos personagens são exageradas, aquelas sobrancelhas e os olhos grandes, a música que acompanha as expressões. Observando esses personagens, vemos que é uma forma como muitos de nós aprendemos os scripts que são apropriados nas situações sociais.”
Segundo o jornal, o estudo que será realizado sobre o tema durará 16 semanas e incluirá 68 crianças com autismo, com idades entre 4 a 6 anos. Metade das crianças receberá uma terapia utilizando os programas ou filmes que eles mais gostam como uma estrutura para aumentar a interação e a construção de habilidades que possibilitem o contato visual e jogo social. A outra metade das crianças será o grupo controle, que receberá a mesma quantidade de interações com um terapeuta, mas de forma livre, lideradas pelo interesse da criança.
Nós da Inspirados pelo Autismo estamos entusiasmados com a realização deste estudo e aguardaremos pelos resultados. Em nosso cotidiano, percebemos que muitas de nossas crianças, adolescentes e adultos com autismo também parecem extremamente interessadas por determinados personagens, que eles podem ter visto em programas infantis, em filmes, em jogos, brinquedos, etc. E acreditamos que as falas, expressões, vestimentas, trejeitos e todas as outras possíveis características divertidas e que tornam cada personagem atraente para a pessoa com autismo possam ser incorporados para criar espontâneos e divertidos momentos de interação social em casa, na escola ou no consultório.
Em nossa abordagem, quando nós sentimos que a pessoa com autismo está totalmente envolvida nessa interação social (na brincadeira com o facilitador, que pode ter sido criada a partir de elementos de um filme ou de personagens), nós então introduzimos pequenas solicitações ligadas às metas que estamos trabalhando naquele momento. Por exemplo, podemos pedir que a criança tenha uma participação física junto ao personagem favorito dela ou que ela responda ao personagem a respeito de determinado tema. Muitas crianças, adolescentes e adultos se sentem motivados e verdadeiramente apreciam esse momento de interação, ao mesmo tempo em que sabemos que eles estão desenvolvendo os seus talentos e habilidades.
Leia o artigo (em inglês) publicado no New York Times para conhecer melhor o ensaio científico que será realizado e também a opinião de outros pais e profissionais sobre atividades lúdicas envolvendo personagens. Quer conhecer a história de Owen e saber como ele se desenvolveu numa terapia que utilizou seus personagens prediletos? Acesse aqui uma matéria no mesmo jornal sobre a experiência dele, contada por seu pai.
Saiba que nós da Inspirados pelo Autismo temos visto que as atividades lúdicas dão certo! Você já tentou algo assim antes para ajudar pessoas com autismo na interação social? Vamos lá! Observe quem são os personagens prediletos da pessoa com autismo nesse momento e traga elementos desse personagem para a interação social de vocês. Você pode improvisar a vestimenta e se esforçar para imitar o personagem e seu jeito engraçado de agir. Acesse a nossa página sobre atividades interativas e se inspire. Depois, conte para a gente como foi a sua experiência. Divirtam-se!
11 comentários em “Como ajudar pessoas com autismo na interação social”
Meu nome é Lindanor Pontes, professora na APAE, cidade de Iranduba, Am. Trabalho com autistas de 4 a 12 anos. Um caso em especial de um garoto de 8 anos que gosta do Incrível Hulk e Robôs. Sempre que quero sua atenção em determinada tarefa entro em seu mundo e brinco para conseguir atingir meu objetivo.
Amei a reportagem e me inspirou mais ideias para meu dia a dia.
Olá Lindanor,
Agradecemos pelos seus comentários e ficamos felizes em saber que o nosso artigo trouxe inspiração para o seu trabalho.
Nós lhe desejamos muito sucesso em sua trajetória com os seus alunos!
Atenciosamente, Equipe Inspirados pelo Autismo
Oi, boa noite!
Sou professora e na sala que leciono tinha um aluno com autismo. Ele não falava e nem ouvia. Senti um pouco de dificuldade em trabalhar com ele, pois não tinha muita experiência nesses casos. Mas procurei ajuda na Internet e até consegui avanços com ele (nesse próprio site). Ele adorava galinha pintadinha, sempre que eu colocava, ele olhava e pegava na gente. Ficava feliz quando via a alegria dele! E também nos dando atenção e avanços na hora dos jogos…Um abraço e o meu muito obrigado!!!!
Boa tarde, Sávia!
Agradecemos pelo seu contato e pela apreciação em relação ao nosso trabalho.
Parabéns por buscar informações para auxiliar o seu aluno com autismo!
Recomendamos que você leia em nosso site, caso ainda não tenha lido, o texto sobre as nossas estratégias para incorporar o estilo responsivo na escola, que poderá lhe ser útil: http://www.inspiradospeloautismo.com.br/a-abordagem/o-estilo-responsivo-na-escola/
Atenciosamente, Equipe Inspirados pelo Autismo
Amigos, como faço para conseguir apoio em São Paulo? Obrigada!
Olá! Amei este espaço acolhedor e inclusivo. Trabalho em uma sala de recursos e já atendi 3 autistas. As informações e propostas que vocês trazem são realmente inspiradoras. Parabéns! Muito sucesso nesta caminhada do bem!
Olá Michele,
Agradecemos pelas palavras carinhosas de apreciação sobre a nossa abordagem. Muito sucesso em seu trabalho!
Atenciosamente, Equipe Inspirados pelo Autismo
Boa noite. Tenho uma filha com 32 anos com autismo, foi diagnosticada quando tinha 1 ano. A partir dessa idade passou a fazer todos os tratamentos existentes na época numa clínica bem longe da minha casa, mantida pela LBA, hoje extinta. Não aprendeu a ler nem escrever, não entrava na sala de aula para crianças especiais por causa do barulho que elas faziam. Ficou 2 anos na salinha de recursos sendo assistida pela professora que atendia uma criança de cada vez por 45 minutos. Isso na rede escolar pública. Hoje ela faz somente tratamento neurológico. Percebo que hoje tem muitos recursos, muito diferente daquela época que até os pediatras desconheciam essa síndrome.
Olá Jussara,
Agradecemos por nos contar um pouquinho sobre a sua vivência com a sua filha. Nós da Inspirados pelo Autismo estamos sempre divulgando, através de nosso blog, notícias sobre pesquisas e estratégias para ajudar crianças, adolescentes e adultos com autismo. Para saber mais sobre a abordagem que utilizamos, recomendamos o acesso ao link a seguir: http://www.inspiradospeloautismo.com.br/a-abordagem/. Um dos pressupostos de nosso trabalho é a plasticidade cerebral e, nesse sentido, acreditamos que as estratégias da nossa abordagem podem ser úteis à sua filha. Recomendamos também a leitura de nossa página sobre a adaptação de ambientes físicos para pessoas com autismo: http://www.inspiradospeloautismo.com.br/a-abordagem/a-criacao-do-ambiente-fisico-otimizado-para-autismo/. Esta página pode ajudar vocês a criar ambientes onde a sua filha sinta-se mais confortável.
Atenciosamente, Equipe Inspirados pelo Autismo
Sou professora da rede municipal de ensino do Rio de Janeiro e trabalho com crianças incluidas em turmas regulares. Fico muito feliz ao ler este artigo, pois sempre trabalhei desta forma. Planejo minhas aulas a partir das preferências das crianças e posso garantir que traz muito resultado. Venho apresentando relato das minhas experiências em seminários, exatamente sobre esse tema.
Olá Sonia,
Agradecemos por nos contar sobre a sua trajetória e o seu trabalho. Que bom saber que você busca conhecer as preferências dos seus alunos ao planejar as atividades!
Nós investigamos os interesses e motivações atuais de cada criança, inclusive os personagens, para preparar as nossas atividades lúdicas. Cada atividade possui também uma meta educacional e uma ação motivadora.
Temos ideias de atividades em nosso site (acessível pelo link: http://www.inspiradospeloautismo.com.br/a-abordagem/atividades-interativas-para-pessoas-com-autismo/) e também no Livro Brincar para Crescer (http://www.inspiradospeloautismo.com.br/livros/brincar-para-crescer/).
Que o seu trabalho continue ajudando muitas crianças com autismo!
Atenciosamente, Equipe Inspirados pelo Autismo